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O EXÍLIO NO ANA FADANELLI*

Não lembro exatamente do ano, mas certamente foi após 1970 e antes de 1974.

Creio que naquela época já não mais éramos obrigados a usar a “tradicional” veste escolar composta por calça azul marinho para os meninos e saia da mesma cor para as meninas, já a parte superior a vestimenta era idêntica, “guarda-pó” branco e uma gravata na cor azul marinho.

Imagino que à época já usávamos as tais de camisetas, uma novidade para aqules tempos bicudos. Umas na cor branco, outras em amarelo e se não estou equivocado havia também na cor azul marinho, todas com o nome da escola estampado no peito.

Pois bem, nos apresentamos no João Triches para o inicio de mais um ano letivo. A maioria sempre eufórica por poder reencontrar os colegas, matar a saudade e de certa forma se livrar dos rigores de nossos pais ou responsáveis como chamavam à época.

E o sino “bateu” religiosamente às 07h30min.

Como não havíamos encontrado nossos nomes em qualquer lista apontando a sala de aula ficamos acantonados naquela área aberta entre uma coluna de salas e outra (a que possuía somente a cobertura) localizada entre os banheiros e a cozinha/sala da banda.

Em poucos minutos fomos informados para nos posicionarmos logo abaixo da escada, no local onde habitualmente, em formação militar hasteávamos a bandeira do Brasil e cantávamos semanalmente os hinos exigidos pela Direção da Escola.

Em um pronunciamento sem qualquer rodeio ou sem o direito a qualquer tipo de argumentação ou mesmo sem termos o direito de dizer sobre onde morávamos ou de como chegaríamos ao “novo” endereço, fomos informados de que naquele dia seríamos liberados, mas que no dia seguinte teríamos de nos apresentar no COLÉGIO ANA FADANELLI que tinha sua localização, se não estou e equivocado, na Rua José Gollo, quase nos fundos do Cemitério Público Municipal, em uma paralela que fica entre a Ernesto Alves e a Matheo Gianella.

E lá fomos nós.

Em casa um mar de perguntas e o desespero por não termos respostas e nem meios para qualquer tipo de reação.

No meu caso a distância mais que dobrou, pois eu morava em um velho casarão próximo a Padaria Santa Catarina, localizado na Rua Ângelo Chiarello, quase na divisa entre o Pio X e o São José.

Dali até o João Triches era atravessar a Av. Rosetti, percorrer a estradinha que serpenteava o morro do pocinho (o “pocinho” ficava nas terras dos Ruaro), passávamos ao lado do palacete do Seu Dal Zotto (que era o “dono” da empresa Madal) e muitas vezes acessávamos o recinto da escola por um dos tantos rasgos que havia na tela que fazia as vezes de separador dos terrenos lindeiros.

Pois bem, para chegar ao “novo” destino eu deveria continuar a jornada, passando pelo João Triches , entrando na rua Campo dos Bugres, e atravessando a Matheo Gianella e continuar minha saga diária por uma ruazinha que ainda é quase um atalho e que fica à direita de quem vem pela Matheo para por fim subir o morrinho até encontrar a Rua La Salle e só depois, uns 300 metros mais adiante chegarao “Ana Fadanelli”.

É claro que tudo isso à pé e enfrentando tudo aquilo que nos cabia tal como frio, chuva, barro, etc...

E chegamos ao “Ana Fadanelli”, local de nosso exílio, pois as escolhidas para esse afastamento foram apenas algumas turmas.

Lá a situação ia da quase desgraça ao puro e pleno divertimento.

De um lado, para os nativos do Ana Fadanelli, nós éramos reles forasteiros, quase invasores de seus domínios e muito sofremos para nos mantermos em um território que não era nosso mas que deveria ser defendido com toda a força possível.

De outro lado, nós convivíamos diariamente com o fantasma da não aceitação interior por termos sido expurgados do João Triches, mesmo que temporariamente, irresignação que nos levou a ter algumas baixas em nosso pequeno e imaginário exército.

Já na “nova” escola, nos concentrávamos na parte inferior que correspondia ao um pequeno “pátio”, o de nosso exílio, onde ao fundo existia um muro de pedras de uma altura quase inimaginável e mais a direita a divisa com o Cemitério Público.

Para adentrar ao recinto da escola éramos obrigados a subir uma longa e estreita escada de concreto armado, feito isso desembocávamos em um corredor onde enormes portas davam acesso a nossas novas acomodações.

As paredes que dividiam as salas eram de madeira, feitas das tais tábuas "macho-fêmea" na cor verde água, o pé direito de cada sala era de mais de 4 metros e consequentemente as “divisórias” viviam balançando de um lado para outro.

Mas não balançavam ao seu bel prazer ou por qualquer outro problema de ordem estrutural, balançavam sempre que um de nós esbarrava ou propositadamente batia de um lado, no que prontamente era respondido pelos colegas exilados na sala contígua.

Haja paciência de funcionários e de nossos professores.

E assim passamos um ano de exílio. No ano seguinte retornamos à nossa origem e base escolar do João Triches.

Mais tarde o Ana Fadanelli foi consumido por um incêndio e hoje no local onde se encontrava a escola existe um condomínio de moradias.

*Extraído da publicação no WatsApp de 31/01/2018

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